quinta-feira, 14 de maio de 2009

Pequenas considerações

O público e o privado

Em meio a notícias cotidianas sobre os abusos que autoridades cometem quando investidas em cargos públicos, especialmente os que envolvem ganhos financeiros ilegais, a descrença na honestidade daqueles que se enveredam na carreira pública, seja como agentes políticos, seja como servidores públicos, aumenta consideravelmente, chegando à beira da certeza de que, se nessa esfera homens íntegros há, são tão raros que suas ideias acabam sepultadas pela busca impávida de vantagens pessoais da maioria.

Não defendo juízo contrário, e depois do escândalo das passagens no Congresso Nacional, penso que o fio de esperança que se podia ter na proba gestão da coisa pública pelos políticos atuais foi rompido. Por outro lado, entendo que não basta somente o voto para modificar essa realidade, e tampouco fará relevante diferença mudanças pontuais nas regras eleitorais. A meu ver, há que se ir além.

Como consabido, os problemas vêm de longe. A conturbada história brasileira caracteriza-se em demasia pelo voluntarismo político. Os governantes da Nação são lembrados muito mais por suas particularidades do que pelos projetos de governo que implementaram. O Brasil sempre dependeu mais de homens do que de ideias. E homens, quando chegam ao poder e não possuem regras costumeiras e modelos políticos sólidos a seguir, confundem-se com as prerrogativas do cargo que ocupam, esquecendo-se que estão no exercício de uma função pública, e não sendo servidos por ela.

É imprescindível que se eduque as gerações futuras para que compreendam, desde cedo, as diferenças e nuanças que caracterizam a esfera pública e a privada. Hoje, formam-se universitários aos borbotões sem essa noção. Esse quadro tende a agravar-se consideravelmente, dada a facilidade de comunicação atual, que, paradoxalmente, apesar de encurtar distâncias, faz com que o homem se feche mais em si mesmo, como se uma mônada fosse, e despreze o que não se lhe apresente prontamente aos olhos: a coisa pública, por exemplo. Faz-se necessária uma (árdua) mudança de mentalidade e o repasse de ideais comunitários e éticos, seja no lar, na escola e em outros âmbitos da sociedade civil. Apenas assim poderá haver uma compreensão mínima de que não se pode de forma alguma estender certas prerrogativas da vida pública para a vida privada, bem como que aqueles que, de uma forma ou de outra, representam o povo, possuem a inquestionável obrigação de velar pelos interesses da coletividade muito antes dos seus, e de saber que o cargo que ocupam é maior do que eles mesmos.

sábado, 9 de maio de 2009

Rapidinhas

Aquecimento global






Muito bem bolado esse vídeo, não? Não é exagerada a comparação: o habitat de milhares (sim, milhares) de espécies já foi destruído. E o aquecimento global é um problema tão constante que dele nos esquecemos (assim como os escândalos políticos brasileiros, embora estes não sejam tão grave quanto o derretimento das calotas polares). Enchentes no nordeste (Maranhão, Piauí) e seca extrema aqui no Rio Grande do Sul. Algo estranho, não? As mudanças climáticas, dentre as quais se enquadra o aumento na temperatura do planeta, estão só começando. A natureza reage ao homem, ser passageiro na Terra, que em pouco tempo, considerada a história do planeta, fez estragos demais. Mas não temamos pelo planeta: ele já passou por períodos de modificações extremas até chegar aos dias de hoje. E continua se modificando. O homem é que, se continuar no ritmo frenético do chamado desenvolvimento, acabará destruindo a si mesmo. Alguém duvida? Sem maiores delongas: não precisamos de tanto. Viver em harmonia com a natureza pode não ser tão prático, mas é mais prazeroso. Pena que as novas gerações não estejam nem experimentando tal interação.



Gilmar Mendes e a imagem da Justiça brasileira



Para alguns, Gilmar Mendes é o maior constitucionalista brasileiro. Para outros, um Ministro do Supremo Tribunal Federal que aparece mais do que deve e protege os podero$o$ em seus julgamentos, além de ser político demais e possuir um passado nebuloso. Trata-se de impressões corriqueiras a quem acompanha as notícias de âmbito nacional e, principalmente, as do âmbito jurídico. Tudo veio à tona na recente discussão entre ele e o Ministro Joaquim Barbosa, que afirmou que Mendes estaria destruindo a imagem do Poder Judiciário. Quem não assistiu, não pode deixar de fazê-lo:
http://www.youtube.com/watch?v=sIUdUsPM2WA



Para mim, assim como para muitos, Barbosa mostrou que ainda há juízes no Brasil. Mendes, embora não possa ser acusado, fundamentadamente, de parcial, deixa dúvidas sobre seu modo de agir. E, como disse Cícero, "não basta à mulher de César ser honesta: ela tem que parecer honesta". Não é o caso de Mendes, como demonstra o e-mail que recebi ontem, sobre 25 perguntas a serem respondidas por Mendes. Segue abaixo:



"25 Perguntas a Gilmar Mendes (Presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil)
1.O sr. sabe algo sobre o "assassinato" de Andréa Paula Pedroso Wonsoski, jornalista que denunciou o seu irmão, Chico Mendes, por compra de votos em Diamantino, no Mato Grosso?
2.Qual a natureza da sua participação na campanha eleitoral de Chico Mendes em 2000, quando o sr. era advogado-geral da União?
3.Qual a natureza da sua participação na campanha eleitoral de Chico Mendes em 2004, quando o sr. já era ministro do Supremo Tribunal Federal?
4.Quantas vezes o sr. acompanhou ministros de Fernando Henrique Cardoso a Diamantino, para inauguração de obras?
5.O sr. tem relações com o Grupo Bertin, condenado em novembro de 2007 por formação de cartel? Qual a natureza dessa relação?
6.Quantos contratos sem licitação recebeu o Instituto Brasiliense de Direito Público, do qual o sr. é acionista, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso?
7.O sr. considera ética a sanção, em primeiro de abril de 2002, de lei que autorizava a prefeitura de Diamantino a reverter o dinheiro pago em tributos pela Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas de Diamantino, da qual o sr. é um dos donos, em descontos para os alunos?
8.O sr. tem alguma idéia do porquê das mais de 30 ações impetradas contra o seu irmão, ao longo dos anos, jamais terem chegado sequer à primeira instância?
9.O sr. tem algo a dizer acerca da afirmação de Daniel Dantas, de que só o preocupavam as primeiras instâncias da justiça, já que no STF ele teria"facilidades" ?
10.O segundo habeas corpus que o sr. concedeu a Daniel Dantas foi posterior à apresentação de um vídeo que documentava uma tentativa de suborno a um policial federal. O sr. não considera uma ação continuada de flagrante de suborno uma obstrução de justiça que requer prisão preventiva?
11.Sendo negativa a resposta, para que serve o artigo 312 do Código de Processo Penal segundo a opinião do sr.?
12.Por que o sr. se empenhou no afastamento do Dr. Paulo Lacerda da ABIN?
13.Por que o sr. acusou a ABIN de grampeá-lo e até hoje não apresentou uma única prova? A presunção de inocência só vale em certos casos?
14.Qual a resposta do senhor à objeção de que o seu tratamento do caso Dantas contraria claramente a *súmula 691* http://www.dji/. com.br/normas_ inferiores/ regimento_ interno_e_ sumula_stf/stf_ 0691a0720. htmdo próprio STF?
15.O sr. conhece alguma democracia no mundo em que a Suprema Corte legisle sobre o uso de algemas?
16.O sr. conhece alguma Suprema Corte do planeta que haja concedido à mesma pessoa dois habeas corpus em menos de 48 horas?
17.Por que o sr. disse que o deputado Raul Jungmann foi acusado "escandalosamente" antes de que qualquer documentação fosse apresentada?
18.O sr. afirmou que iria chamar Lula "às falas". O sr. acredita que essa é uma forma adequada de se dirigir ao Presidente da República? O sr. conhece alguma democracia onde o Presidente da Suprema Corte chame o Presidente da República "às falas"?
19.O sr. tem alguma idéia de por que a Desembargadora Suzana Camargo, depois de fazer uma acusação gravíssima– e sem provas – ao Juiz Fausto de Sanctis, pediu que a "esquecessem" ?
20.É verdade que o sr., quando era Advogado-Geral da União, depois de derrotado no Judiciário na questão da demarcação das terras indígenas, recomendou aos órgãos da administração que não cumprissem as decisões judiciais?
21.Quais são as suas relações com o site Consultor Jurídico? O sr. tem ciência das relações entre a empresa de consultoria Dublê, de propriedade de Márcio Chaer, com a BrT?
22.É correta a informação publicada pela Revista Época no dia22/04/2002, na página 40, de que a chefia da então Advocacia Geral da União, ou seja, o senhor, pagou R$ 32.400,00 ao Instituto Brasiliense de Direito Público - do qual o sr. mesmo é um dos proprietários - para que seus subordinados lá fizessem cursos? O sr. considera isso ético?
23.O sr. mantém a afirmação de que o sistema judiciário brasileiro é um "manicômio"?
24.Por que o senhor se opôs à investigação das contas de Paulo Maluf no exterior?
25.Já apareceu alguma prova do grampo que o sr. e o Senador Demóstenes denunciaram? Não há nenhum áudio, nada?"



Gostaria de ver muito essas respostas...



Felipe



Ser pai é uma experiência fascinante. Quando a gente está se acostumando com o jeitinho do pimpolho, ele cresce, fica diferente, surpreende com novas atitudes e com o jeitinho cada vez mais inconfundível. Cada dia de um bebê é distinto do dia anterior. Quanto a mim, isso desafia minha rotina e minhas concepções, meu modo de agir e pensar. Sem perceber, pareço estar me tornando uma pessoa melhor. Estar com o Felipe me basta para trazer felicidade como nada até então. Amor indescritível.


terça-feira, 5 de maio de 2009

A "mulher chorona' e os políticos brasileiros

Aconteceu no verão de 2006. Na época, eu trabalhava na Justiça Eleitoral, mais especificamente no Cartório Eleitoral de Taquari. Aqui no RS, esse órgão e muitos outros adotam um expediente "relax" no verão: a carga horária é diminuída, e sexta-feira as atividades começam e se encerram mais cedo, com o intuito de que pessoal possa viajar mais cedo para a praia. (Sério, é verdade!) Acontece que eu não morava em Taquari: ia e voltava todo o dia de São Leopoldo, distante cerca de 100km, porque ainda estava cursando a faculdade de direito em Porto Alegre. Como na quinta o expediente se encerrava às 18h e, na sexta, começava já às 8h, eu sempre dormia naquela agradável cidade de colonização açoriana, terra do ex-presidente Costa e Silva (um dos 5 da ditadura, lembram? Governou entre 1967 a 1969, iniciou a fase mais dura e despótica dessa fase negra da história brasileira com o AI5 - o que não me deixaria orgulhoso, mas em sua terra natal há até museu em homenagem a ele), da laranja (apesar de só haver uma rua com pés de laranjas) e do mel (que só achei na casa de um velho português radicado por lá). Foi numa dessas ocasiões que conheci o "seu" Antônio.



Eram 4 horas da madrugada de uma sexta-feira. Eu voltada de uma festa na cidade de Lajeado, nas proximidades, junto com um amigo, ex-colega do INSS local, onde eu já tinha trabalhado. Havia uma neblina densa na estrada, que impedia qualquer tentativa racional de andar a mais de 60km/h. Conversávamos para evitar o sono, comentando nossas impressões da noite quando, chegando no trevo de entrada da cidade, visualizamos um objeto à primeira vista não identificado. Esfregando os olhos, não tivemos dúvidas: havia um carro tombado à beira da estrada, literalmente virado de cabeça para baixo. Estava caído num barranco. Paramos no acostamento, já bem acordados. Com cuidado, nos aproximamos, caminhando em meio ao barro do local. Gelamos de apreensão.

Era um Uno Mille. Como já havia sido proprietário de 2 desses veículos tempos antes, sabia que não se davam muito bem com curvas mais acentuadas. Imaginei o trajeto do motorista por um instante, mas um grito me chamou a atenção:

- O pessoal! O pessoal aí atrás, meu Deus do céu! - bradava a relutante voz vinda do banco do motorista.

Suspirei de alívio. Não havia ninguém morto. (Não é nada agradável ver uma pessoa recém morta. Já passei por isso, e não guardo boas recordações). Tratamos de tentar acalmar o acidentado - homem baixinho, aparentando uns 50 anos de idade -, mas ele não se aquietava. Falei para ele ficar calmo, que estávamos ligando para a Polícia Rodoviária e o socorro já ia chegar. Mas não adiantou: ele gritava cada vez mais pelo "pessoal de trás", e começou a tentar sair do veículo virado. Não concordamos, mas não dava para evitar: com bastante dificuldade, ele conseguiu pular para o banco de trás e sair pelo porta-malas, que não estava chaveado e pode ser aberto por nós. Sabia que não se deve mexer em pessoas acidentadas, que o risco de lesão é muito grande. Porém, não adiantou argumentar: o homem era teimoso e parecia estar noutra dimensão.

Em meio a tudo isso, procurávamos por outras pessoas perdidas pela volta. No carro, não havia ninguém. Os vidros estavam fechados e não havia indícios quaisquer de que alguém pudesse ter se perdido na queda. Mas o acidentado afirmava insistentemente que os outros estavam ali atrás. Ele conseguiu sair do veículo. Erguemos seu corpo e colocamos ele sentado. Estava ensopado de sangue, e precisava de apoio para não desmoronar no chão. Do pouco que sabia e sei sobre primeiros socorros, entendi que precisava mantê-lo lúcido. Enquanto aguardávamos longos 40 minutos até os policiais chegarem - liguei de pronto para eles quando saí do meu carro; disseram que logo chegariam junto com uma ambulância ao local -, o nosso então paciente disse que se chamava Antônio e que era da pequena cidade de Tabaí - município vizinho de Taquari e que é conhecido pelo trecho da BR 386 que encerra: a rodovia Tabaí-Canoas. Fora isso, só arrancamos dele que ele havia "tomado todas" (nem era preciso dizer: seu odor de cachaça "da braba" não deixava dúvidas disso).

Os policiais chegaram, questionaram se eu e meu colega tínhamos causado o acidente e, com uma calma (leia-se preguiça) descomunal, começaram a olhar o veículo e seu entorno, aparentando grande conhecimento sobre o procedimento, e a realizar algumas ligações. Mal olharam para o pobre Antônio. Questionei-lhes sobre o socorro e, ao saber que eles antes removeriam o carro do local - o que daria um bom trabalho - para, só então, levar o capotado ao hospital, fiquei furioso, dizendo que iria levá-lo. O policial não gostou do meu tom, mas antes dele me refutar, para não perder tempo e não estender a angústia sobre a saúde do cidadão, identifiquei-me como chefe do cartório eleitoral da cidade - eu realmente o era -, esclarecendo que trabalhava com a juíza local. Foi o que bastou para ele mudar o semblante do rosto e me elogiar, dizendo que se tratava de uma atitude nobre da minha parte. Patifes. Partimos, então.

Foram longos 12km na estrada Aleixo Rocha, que liga a RS 287 à cidade de Taquari. A neblina era muito intensa, e como a estrada não tinha sinalização alguma, tive que guiar a menos de 40km/h. O esforço maior, porém, foi manter o "seu" Antônio acordado. Ele foi no banco da frente, enquanto meu amigo estava atrás, segurando-o. Conseguimos conversar um pouco. Ele informou que trabalhava numa madeireira da cidade de Tabaí e que tinha ido numa festa na zona do meretrício. Estava na gandaia, o safado! Insistiu que tinha gente atrás dele e balbuciou algo sobre suas filhas. Foi difícil mantê-lo acordado. Sacodíamos ele, falávamos alto, mas o sono do "" parecia ser mais forte. Foi então que aconteceu.

Sinceramente: considerando o contexto sério de toda situação, por essa eu não esperava - e olha que eu costumo brincar de futurologia e não me surpreender com qualquer coisa. "Seu" Antônio foi se inclinando para a frente, pouco a pouco. Antes que pudéssemos tentar alertá-lo, ergueu-se de supetão, cantalorando a plenos pulmões: "Eta mulher chorona!... chora feito...". E seguiu tentando seguir no ritmo, em meio a nossas inevitáveis gargalhadas.

Para quem não conhece, está aí a canção, um clássico do gênero:

http://www.youtube.com/watch?v=kNsoiyszBis

Chegamos no hospital depois de outras quatro tentativas do "seu" Antônio de continuar no ritmo da festança. Só lá fomos saber que ele era o Presidente da Câmara Municipal de Tabaí. Uma autoridade, o homem! Deixei meu número de celular e, já com o sol a pino, fui para o hotel dormir. O relógio marcava 6h30min da manhã. O descanso deveria ser breve.

Meu sono, porém, não durou muito. O pessoal do hospital conseguiu informar os parentes do talentoso intérprete da "mulher chorona" sobre o ocorrido e um deles me ligou. Eram 7h15min, e mal pude acreditar quando ele, que realmente não lembro quem é, de pronto me pediu sigilo absoluto a respeito do episódio, enfatizando a importância da figura do vereador Antônio para a comunidade. Despertei do meu meio-sono imaginando qual impropério dizer pro sujeito. Limitei-me a retrucar:

- De jeito nenhum! A sorte dele é que não vivo aqui, e tenho poucos conhecidos. Se dependesse de mim, não ia haver uma pessoa sequer na região que não soubesse desse acidente!

Não me ligaram mais. Confesso que sei ser até intimidativo, nas raras vezes em que alguém consegue me irritar. Contei o que aconteceu para absolutamente todas as pessoas que eu conhecia na cidade, inclusive a respeito do "pedido" de segredo. Ri sozinho ao comprar o jornal da região e ver uma foto do respeitável Presidente da Câmara tabaiense numa inauguração de obras na cidade vizinha. Brasil, Brasil, Brasil.

Apesar da parte cômica dessa história, interessa-me refletir rapidamente sobre a atitude do Antônio e a solução dada para "abafar" o acontecido. É que apesar dele ser apenas um vereador de um município minúsculo (tem menos de 5.000 habitantes) do interior do Rio Grande do Sul, seu modo de agir e de resolver a questão assemelha-se ao que grande (enorme!) parte dos políticos brasileiros faz. Lembram do Renan Calheiros e a pensão que empreiteiros pagavam ao seu filho de um relacionamento extraconjugal? E o castelo do deputado federal Edmar Moreira, excluído do seu imposto de renda? E as passagens aéreas, que quase todos os parlamentares do Congresso Nacional gastavam para fins exclusivamente particulares, uso do qual foram acusando-se aos poucos, só quando não dava mais para negar? Fico nesses exemplos. Você conhece outros tantos, tenho certeza.

O que acontece é que o político brasileiro, em geral, não está nem aí para sua imagem. Que o diga o deputado federal gaúcho Sérgio Moraes, que ontem mesmo disse estar se lixando para a opinião pública, pois se reelegia de qualquer jeito (deixando subentendido: apesar de suas falcatruas conhecidas por todo o Brasil, expostas em reportagem da Revista Veja no ano passado, ele volta). O homem público tupiniquim até dá uma disfarçada, mas a verdade acaba aparecendo. O problema é o que nós fazemos com ela depois...

Discordo que nossos políticos sejam a imagem do povo brasileiro. Muitos dizem isso. Eu não acho que o povo brasileiro seja como Hidelbrando Pascoal, Jáder Barbalho, Fernando Collor, Paulo Maluf e tantos outros. Porque esses, embora moralmente estejam abaixo da linha do começo de qualquer escala, são pró-ativos, se mexem, procurando seu espaço, fazem o possível para garantir uma boquinha. Agem, embora para o mal. O povo brasileiro é pior, porque embora esteja, via de regra, do lado do bem (comum), reelege e consagra tipos assim. Pior porque raramente se insurge e, ao ver alguma manifestação de professores, policiais ou qualquer outra categoria, reclama que vai chegar mais tarde em casa e perder o começo da novela, sem nem cogitar refletir acerca do que está se passando ali. O povo brasileiro quer comodidade, vende seu voto barato e, dias depois da eleição - aquele domingo chato, dizem, em que se deve perder tempo indo votar -, já esqueceu do comprador. Acredita em palavras vazias, em promessas impossíveis e se deixa levar pelas músicas de campanha e outros recursos publicitários que agradam aos olhos. Ou dá de ombros, dizendo que todos são iguais.

Não, não estou exagerando. É assim mesmo: reelegemos gente pior do que nós. Claro que há pessoas honradas lá, e claro que há pessoas piores aqui, na sociedade. Mas, em regra, é assim: não nos importamos em pesquisar histórico pessoal, profissional e de perquirir a capacidade de quem elegemos. Contentamo-nos com um minuto de dúvida e com a escolha mais fácil e rápida, ou nos deixamos levar por terceiros, que nos convencem com alguma simpatia e meia dúzia de sorrisos. Contratamos aqueles que nos governam, que decidem o percentual de imposto que pagamos, as leis que devemos seguir e as punições que nos são dadas por infringi-las; pensamos levianamente que não faz diferença, sem cogitar que, dependendo do posicionamento tomado por partidos e políticos, seja em nível municipal, estadual ou federal, pagaremos mais ou menos pelo pão na padaria, teremos mais ou menos imposto de renda retido na fonte, enfrentaremos mais ou menos pedágios, conseguiremos empréstimos e ganhos de investimento com mais ou menos juros, poderemos andar na rua com mais ou menos tranquilidade, teremos, ou não, esgoto tratado e energia elétrica. Enfim, deixamos de lado a importância de escolher, na figura do candidato e na sigla do partido, os rumos que queremos para o dia de amanhã e para o futuro daqueles que nos são caros.

Sim, somos nós, eu e você, que permitimos que pessoas irresponsáveis e que não honram, dia a dia, na vida pública e na privada, o cargo que ocupam, estejam lá. Eu e você deixamos o "seu" Antônio, motorista irresponsável e político de moral duvidosa, decidir o rumo que nossas vidas tomarão. Os cargos eletivos no Brasil são comparáveis com o estabelecimento de onde o "seu" Antônio se encontrava antes de tombar seu Uno Mille: o interesse financeiro rege as relações, o mundo externo é deixado de lado e afastado tanto quanto possível e, dentro deles, a festa é completa, e a trilha sonora segue nessa sonoridade: "Eta mulher chorona... chora feito uma safona...". Pobres e malditos de nós.


domingo, 3 de maio de 2009

O Sertão e a Certeza

Dia desses, no trabalho, um colega me contou que sua empregada doméstica havia chegado pela manhã em sua casa faceira, noticiando que tinha ganhado dois cachorrinhos de uma vizinha, um macho e uma fêmea. Com sua falta de calma habitual, meu colega lhe pergunto de pronto - imagino que ironicamente - os nomes que ela daria aos bichinhos. Orgulhosa, a moça disse que o macho chamar-se-ia Sertão. Surpreso, meu colega balbuciou supor que o nome da cadela, então, seria Baleia (incorrendo no corriqueiro e infeliz equívoco daqueles que apenas "ouvem falar" de livros e suas histórias: ligar a famosa (e amorosa) cachorra personagem de "Vidas Secas", Baleia, de autoria de Graciliano Ramos, aos romances "Grande Sertão: Veredas", de Guimarães Rosa, e "Os Sertões", de Euclides da Cunha - este, para mim, o melhor de todos). Inconformada, a moça se insurgiu: "Não, que isso, doutor! É uma cachorra, não um peixe! Se o macho é Sertão, é claro que a fêmea é a Certeza!"


Não cortei o barato dele, que passou a bradar sobre a falta de conhecimento e de noção do povo brasileiro. Fiquei tentado a incluir na conversa a falta de conhecimento literário e o pseudoconhecimento utilizado para a glória própria, mas deixei pra lá. Algumas pequenas batalhas não valem a saliva, isso aprendi muito cedo na vida. O que me importou, no caso, foi reparar não no trocadilho, mas na dita certeza, a forma feminina do muito certo, ou "certão", de acordo com a dona dos cães. Enfim, cabe a pergunta: existe alguma certeza, além da cadelinha que encontrou um novo lar ao lado de seu companheiro S(C)ertão?



Desde cedo, as certezas me causavam espanto. Meu pai é daquelas pessoas "oito ou oitenta", para quem algo é certo ou errado, pessoas são boas ou más, essas coisas. Fui criado assim, fadado a crer em Deus, no trabalho, na propriedade e na família. Felizmente, cedo superei esses valores como mitos, e entendi que se tratam muito mais de convenções sociais do que de verdades absolutas. Comecei a duvidar daquelas certezas que eram muito bonitas na teoria, mas que não me apareciam no dia a dia; muito antes pelo contrário, eu não conseguia enxergar Deus nas desigualdades e na má sorte de muitos, nem entendia como empregos que exigiam o sangue daqueles que os ocupavam poderiam trazer dignidade, achava estranho haver tantas propriedades, tanta divisão da terra, tanta gente sem um pedacinho de grama sequer e, fora minha ligação amorosa com meus pais, não via um sentido sagrado na convivência com tios e primos distantes que nada tinham a ver comigo. Não que eu tenha abandonado os valores perenes do meu pai por completo: apenas passei a enxergá-los com um olhar de dúvida e descrença, entendendo que, como quase tudo no mundo, há sempre um lado melhor que outro. Enfim, as certezas que se me apresentavam eram frágeis demais - como todas efetivamente o são.



E foi sempre assim: as certezas que qualquer pessoa me apresentava como inquestionáveis eram mentalmente destruídas por mim em segundos. Desde as certezas teológicas até a própria morte, que pode ser pensada considerada uma passagem rumo a um outro mundo, uma iluminação ou a destruição total: para mim, nenhuma dessas ideias é absolutamente certa, exclui a outra ou é impensável. A morte - assim como a vida -, simplesmente, é desconhecida até que venha - e é isso, particularmente, que a torna tão interessante.



O século XIX foi palco da destruição de certezas antigas e construção de novas. Freud, Marx e Nietzsche, os "mestres da suspeita", termo de autoria do filósofo Paul Ricouer, mostraram novas formas de se pensar o mundo e suas manifestações. Querendo ou não, o século XX deve muito daquilo que teve de bom e de mau a esse trio, desde avanços no campo dos direitos humanos e do auto-conhecimento ao nazismo e a regimes totalitários. Trata-se de alguns dos (se não os)principais quebradores de certezas da história. No século XX, as mudanças e superações de certezas foram tantas e tamanhas que, pensando bem, não é desrazoável que o homem duvide que está ou possar vir a estar duvidando do que acontece ao seu redor e deixe tudo por isso mesmo.



Com o mar de possibilidades da Física Quântica, veio o tempero desse tempo tão dificilmente conceituável. O Século XXI vem com certezas abaladas oriundas do Século XX, mas insiste em trazer junto consigo algumas que vêm desde o tempo em que o tempo não era contado. Agora, entende-se melhor o Princípio da Incerteza, que falando em grosso modo, torna imperativo o esquecimento das antigas certezas humanas. A questão da interrelação dos eventos físicos, por exemplo, desafias nossas concepções incrustadas em nossas mentes como um rochedo à beira mar desafia a força das ondas: ainda serão necessárias muitas marés para que algum espaço a mais seja conquistado. O maior risco, ao meu ver, é que o homem assuste com as tantas possibilidades que se lhe apresentam e tente se agarrar à segurança de ideias passadas requentadas e disfarçadas com novas roupagens.



Resumindo: o tempo cartesiano já passou. A certeza, para Descartes, era o critério da verdade. Ambos, a verdade, a certeza e Descartes, ficaram no passado.



Por fim, vai uma frase do Filme "O Buda", produção argentina de 2005, que recomendo, e que tem uma palhinha no link mais abaixo (vai o link, não estou conseguindo colocar o vídeo de outro jeito, mas um dia eu chego lá):



"O orgulho do erudito é como o de um condenado que está numa prisão orgulhoso da sua cela, porque é grande."




http://www.youtube.com/watch?v=kheNjk99Z3Y

sábado, 2 de maio de 2009

A sensação de fazer bem feito


Hoje passei a tarde inteira sozinho com meu filho, Felipe. Ele tem 3 meses e duas semanas, e não é exagero dizer que é a minha cara: gordinho, sorriso fácil, faceiro, inquieto, curioso, grita quando está com fome . Enquanto a mamãe, a intrépida Juliana, encarava um dia no Zoológico com sua família, nós dois ficamos curtindo uma movimentada tarde de pai e filho. Felipe mamou (não lhe basta o leite materno; além dele, que é indispensável, ele toma complemento de leite em pó), fez cocô, chorou um pouco, se deliciou com minhas brincadeiras, dormiu um pouco e me proporcionou, durante todo esse tempo, muitos sorrisos. Enfim, uma tarde perfeita.


No meio disso tudo, enquanto eu limpava um volumoso cocô em sua fralda - atividade que antes de ser pai pensava ser dispendiosa, mas que é até agradável, sinceramente -, colocava uma novinha em folha e passava pomada nele para evitar assaduras, deixando-o sorridente e, literalmente, pronto pra outra, me ocorreu a ideia: como é boa a sensação de fazer as coisas bem feitas com nossas próprias mãos, independente da relevância e do resultado que proporcionem!


Explico. Muitos dos bens que logramos obter, muitos dos resultados proveitosos de nosso cotidiano, não são frutos completos de nosso esforço: ou participamos de parte de sua elaboração, ou os ganhamos, tão somente, usufruindo do resultado final, não importando aqui a razão do ganho. Exemplos são muitos. Hoje, ao que me parece, as crianças já não constroem mais seus brinquedos, pelo menos não tanto quanto antigamente: ganham-os prontos para o uso. (Particularmente, sou da época de construir carrinho de rolimã, de fazer uma funda com um pedaço de graveto mais resistente, uma tirinha de couro e outra de borracha, de fazer pipa com um pedaço de plástico, cola, dois fiapos de madeira trançados e uma linha de barbante, de ajeitar perna de pau e construir um telefone com lata de Neston e barbante. Brincava com essas e outras invenções nas ruas de Bicas e Guarará-MG. Mas já não enxergo crianças se divertindo desse jeito). Cada dia mais, enfim, participamos de um dos ideais criados pelo capitalismo: limitamo-nos a usufruir a atividade-fim; terceirizamos, um por vez, cada pedaço de nossas vidas. "Cada um no seu quadrado".


Essa realidade pode ser percebida nas empresas, nas relações de amizade (renegadas, em grande parte, às maquiavélicas "networks"), nos relacionamentos amorosos, na educação dos filhos (muitas vezes passada completamente às babás, escolas etc), na alimentação e nas mais diversas atividade cotidianas, como o corte da grama, o banho do cachorro, a limpeza do carro, entre outras. Há alguns meses, aliás, ouvi uma entrevista na televisão do jornalista da Zero Hora, de Porto Alegre, David Coimbra, a respeito de seu livro "Meu Guri", que se refere a textos que ele publicou sobre a gravidez de sua mulher, desde tal descoberta, até o nascimento e primeiros dias de seu filho, Bernardo (comprei mas perdi a vontade de lê-lo, confesso). David confessou, para meu espanto, que jamais havia trocado uma fralda sequer de seu filho, que à época já tinha mais de um ano. Justificando-se, afirmou que montou uma equipe para cuidar desses detalhes, e que sua principal participação nisso era assinar os cheques. Enfim, anunciou em público a terceirização da troca de fraldas de seu pimpolho - momento que, afirmo de carteirinha, pode parecer banal, mas é revestido de uma magia simples e simplesmente indescritível.


Sei que estamos na "era" da especialização, da falta de tempo para tarefas em princípio pouco produtivas, da terceirização em massa - o que cria empregos, não nego, novas especializações, cursos superiores cujos nomes há pouco nem se ouvia falar e todas as consequências disso tudo -, do conforto máximo com o mínimo de suor possível, essas coisas. Entendo, compreendo na medida do possível, e participo do sistema, não nego. Entretanto, peremptoriamente afirmo: a visão e o gozo do produto do trabalho de terceiros não possuem o mesmo sabor do resultado elaborado a mãos próprias, como a visão da grama bem cortada depois de uma tarde sob o sol, o sabor de uma comida caseira cujos ingredientes foram cuidadosamente escolhidos e preparados, a pia consertada com destreza em meio a muita água jorrando, a camisa passada com cuidado, o carro lavado com precisão milimétrica e, enfim e mais do que tudo, o sorriso de um filho seco e limpinho, de fraldas novas, agradecendo com um sorriso irresistível pela atenção e o carinho recebidos.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

O trabalho e o Dia do Trabalhador

Para que serve o trabalho? Já pensaram sobre isso? Quem já não refletiu sobre aquele famoso paradigma da vida moderna: por que passar 30 anos ou mais se preparando para conseguir um bom trabalho, trabalhando ou pensando nisso durante a maior parte do tempo, se o objetivo, depois de tudo isso, é deixar de trabalhar e "curtir a vida" na aposentadoria, ou seja, nas portas da velhice, quando o entusiasmo para desfrutar o lazer, momentos com a família etc, em regra, já não é tão grande assim?

Ao longo da história da humanidade, o trabalho sempre esteve presente. Desde a etapa pré-civilizatória, o homem necessitava de movimentar-se atrás de seu alimento; a subsistência demandava a própria existência humana. Com o passar do tempo, o aperfeiçoamento da convivência social e a feitura de tecnologias, a divisão de tarefas e a organização, alimentar-se e manter-se abrigado foram se tornando tarefas não tão complicadas para o homem, a ponto de, num clã, serem delegadas a apenas alguns de seus membros, enquanto outros se ocupavam, basicamente, da criação de novas necessidades - desafio cotidiano do capitalismo, até os dias de hoje. Vieram os excedentes de produção, o armazenamento e transporte, o escambo, o comércio. Em suma, chegamos a um tempo em que, para assar um boi inteiro, não precisamos caçá-lo, bastando a visita a um estabelecimento que comercie carnes, onde podemos recebê-lo pronto para o preparo, com a eliminação de diversas etapas. Todo esse processo de facilitação propiciou mais tempo para o homem se ocupar de atividades distintas, resultando na complexa estrutura social hodierna, a respeito da qual se costuma dizer que são necessárias várias vidas para que se descubra todos os modos de vida. Será, então, que o trabalho foi a grande e derradeira invenção humana?

"Sim, é óbvio!", seria a primeira resposta daqueles que, como eu, não possuem a mínima vontade de tornar aos tempos do estado de natureza - nomenclatura dada à época pré-social pelos filósofos contratualistas, como Hobbes, Grotius, Locke, Rousseau - e correr atrás de mamutes ou coisa que o valha pra fazer uma boquinha. Os bônus do modo de vida que a maioria dos habitantes do planeta Terra pratica (não nos esqueçamos que, na própria Amazônia, ainda há tribos indígenas que vivem como há mais de 500 anos, sem contato com o homem ocidental. Sério, pesquise sobre isso!) são evidentes. Porém, os ônus existem e estão mais presentes do que muitas vezes percebemos.

Faça uma rápida descrição de você, silenciosamente. Quem você é? Qual é a sua história? Apresente-se, como numa conversa de bar. Pensou? Duvido que você não tenha mencionado sua profissão/área de atuação. Mas eu não perguntei sobre isso. O que você é, além do trabalho que possui ou quer possuir, do ramo de atividade que seguiu ou quer seguir? O que sobra de você, além de sua posição na sociedade - seja como trabalhador do mercado, dona de casa, agricultor etc? Certamente, muito. Cada ser tem em si uma riqueza de possibilidades que o torna único e essencial no mundo, e faz de sua descoberta um exercício muito interessante. Mas é fácil assim falar, você tira espontaneamente esse pedaço de você desligado da função social/laboral que exerce?

Essa é a questão: no Brasil, a exemplo de muitos outros países ocidentais e orientais, julgamos os outros e a nós mesmos pela função/posição social, pelo trabalho e seus corolários, principalmente os financeiros (leia algum dia "Os Donos do Poder", de Raymundo Faoro, e você vai entender, em parte, porque isso aconteceu aqui). Tornamo-nos atores sociais ligados de maneira inexorável aos segmentos laborais aos quais, seja pela razão que for, nos vinculamos. A pessoa que cada um de nós é por vezes não aparece por inteiro e, quando vem, chega muito depois. É mais fácil, é objetivo julgar os outros por suas profissões e posições. Então, aderimos, em regra, a esse critério. Referimo-nos a nossos amigos, parentes, vizinhos, como o cobrador, o vendedor, o juiz, o advogado, o balconista, o funcionário público, o bancário, o jornalista. Apresentamo-nos referindo nossa formação, nosso trabalho, nossa atividade. Enfim, usamos a máscara do trabalhador, encaixando-se nesse conceito também as do senhor e do escravo, do mendigo e do abastado, entre tantas outras.

Conheci certa vez um médico que, sabendo que sou formado em direito, admirou-se quando lhe contei que a grande maioria dos meus amigos não eram do ramo jurídico, confessando-me só ter médicos como amigos próximos. Olhou-me como se fosse um herege. Dei de ombros, lembrando-me de uma história que li há muito tempo atrás, sobre um viajante que, deparando-se com o mineiro saindo com as mãos sujas de carvão de seu trabalho, perguntou-lhe seu nome, que disse ser Ivan. Querendo puxar conversa, o viajante questionou a Ivan o que ele fazia, esperando ouvir a óbvia resposta sobre sua profissão de mineiro. Para sua surpresa, ouviu do esplendoroso trabalhador: "Amo minha mulher, Kátia". Surpreso, o viajante não escondeu sua momentânea perplexidade, ao que Ivan esclareceu: "Sabes que trabalho nas minas de carvão, pois podes ver minhas mãos sujas e meu rosto moldado sob a foligem. Mas isso não é o que faço de mais importante, é apenas a maneira pela qual ganho meu pão. O que faço de mais importante em minha vida é, certamente, amar minha mulher, assim como os filhos que ela me deu. É isso que vou levar comigo quando morrer, é esse o bem mais precioso que posso ter".

Nesse fim do Dia do Trabalhador, proponho que não ignoremos a importância história da data, que vem das lutas dos trabalhadores por uma jornada justa de 8 horas diárias de trabalho, numa época em que as fábricas exigiam até 16 horas por dia de trabalho de cada operário, em troca de salários irrisórios. Não olvidemos que o trabalho dignifica o homem, sim, e é, quando encarado com prudência, importantíssimo para uma vida digna em sociedade. Contudo, peço que não se esqueçam que o trabalho não é e não pode ser tudo, que a busca incessante de uma vida toda pelo acúmulo de rendas e bens não torna o homem melhor. Peço que se lembrem que ainda somos nossos ancestrais, vagando, embora talvez não espantados, por esse mundo cheio de particularidades interessantes em cada passo, precisando de não muito mais que alimento, abrigo e a companhia um do outro.

O começo

1º de maio de 2009. Dia em que começo a compartilhar com alguém (considerando que haja alguém a ler meus escritos) um pouco da minha vida. Aspectos do meu dia a dia, coisas que me preocupam e que se me apresentam como relevantes, coisas simples com as quais me defronto e que, logo, ensejam um lampejo de opinião pretensiosamente espontânea e não completamente limitada a conceitos anteriormente definidos (ao menos assim o penso). Esses lampejos estarão, quando possível e publicáveis, aqui. Sem compromissos, sem pretensões, sem devaneios desnecessários. Com um pouco de pudor, talvez, e com a pretensão de que a situação que os precedeu, seja cômica, dramática, trágica, normal ou até despida de sentido racional, encontre naquele que a lê uma lembrança de similitude com algo que já viu, pensou, presenciou, ouviu falar. Até porque, de muito novo, há apenas os atores, a decoração do palco e alguns improvisos, que logo repetir-se-ão, sem maiores problemas.

Nesse ínterim, aos poucos, falarei de mim, do que fiz, faço e penso fazer com os dias que me restam. Afinal, apesar do autor não ser tão importante quanto sua obra, esta sempre reflete algo daquele e, muitas vezes, é interessante buscas pontes entre ambos.

Como este é meu primeiro blog, primeira experiência, estou aprendendo a manejá-lo. Hoje tentarei torná-lo interessante de ser lido. As histórias vêm depois.

Saudações,

Marcus Vinícius Diesel de Oliveira