quarta-feira, 10 de junho de 2009

Laicismo

Não raro me deparo com pessoas confundindo as dimensões do humano, mormente no que tange à religiosidade, umas tentando depreciar opiniões de pessoas que cultivam a espiritualidade por entender que não podem elas ser racionais o bastante e que tudo gira em torno de sua fé, outras estigmatizando aqueles que em nada crêem além de si mesmos como vazios de sentido e, por consequência, de credibilidade. Sempre pensei que a religiosidade é pessoal demais para ser levada a discussões públicas. Apesar de cristão, não gosto de ver crucifixos em prédios públicos e sessões de julgamento, e não vejo sentido na proteção de Deus invocada no preâmbulo da Constituição da República de 1988. É algo pessoal demais. Porém, trata-se de um assunto polêmico, e sempre gostei de polêmicas (discussões religiosas e políticas, futebolísticas são as minhas favoritas, no sentido contrário do dito popular que propaga que tais assuntos não se discutem).

Como muitos sabem e outros tantos ignoram, o Brasil é um Estado laico, ou seja, não propugna nenhuma fé, não há religião oficial. Porém, nossa história é católica demais e muitas pessoas têm dificuldades em deixá-la de lado ao tratar da coisa pública (vide crucifixos em plenários de tribunais e repartições públicas e Deus no preâmbulo da Constituição). A Igreja Católica quase sempre foi uma instituição desastrada politicamente, e a cada dia o desafio é deixá-la em seu lugar, ou seja, na própria paróquia, longe de discussões importantes como o uso de células-tronco para pesquisas, legalização do aborto, abertura do comércio em feriados etc. Aliás, essa é a única parte boa do cunho religioso estatal: os feriados religiosos.

Para terminar, encontrei o texto de um autor que deve estar começando, e resolvi dar uma força pra ele publicando suas palavras. Quem sabe um dia ele chega lá!


Laicismo

"Anda acesa a questão do laicismo, a meu ver em termos não muito claros, porquanto parece querer ignorar-se a questão fundamental que subjaz ao debate: crer ou não crer na existência de um deus que, não só terá criado o universo e portanto a espécie humana, como virá a ser, no fim dos tempos, o juiz dos nossos cometimentos na terra, premiando as boas acções com a admissão num paraíso em que os eleitos contemplarão a face do Senhor durante toda a eternidade, enquanto, também por toda a eternidade, os culpados de acções más arderão no inextinguível fogo do inferno. Esse juízo final não será fácil, nem para deus nem para os que vão ter de prestar contas, pois não se conhece um único caso de alguém que, em vida, tenha cometido exclusivamente boas acções ou más acções. O próprio do homem é a inconstância nos propósitos e nos actos, sempre a contradizerem-se de uma hora para a outra. No meio de tudo isto, o laicismo aparece-me mais como uma posição política determinada mas prudente que como a emanação de uma convicção profunda da não existência de deus e portanto da impertinência lógica das instituições e dos instrumentos que pretendem impor o contrário à consciência da gente. Discute-se o laicismo porque, no fundo, se teme discutir o ateísmo. O interessante do caso, porém, é que a Igreja Católica, na sua velha tradição de fazer o mal e a caramunha, anda por aí a queixar-se de ser vítima de um suposto laicismo “agressivo”, nova categoria que lhe permite insurgir-se contra o todo fingindo atacar apenas a parte. A duplicidade sempre foi inseparável das tácticas e das estratégias diplomáticas e doutrinais da cúria romana.

Seria de agradecer que a Igreja Católica Apostólica Romana deixasse de meter-se naquilo que não lhe diz respeito, isto é, a vida civil e a vida privada das pessoas. Não devemos, porém, surpreender-nos. À Igreja Católica importa pouco ou nada o destino das almas, o seu objectivo sempre foi controlar os corpos, e o laicismo é a primeira porta por onde começam a escapar-lhe esses corpos, e de caminho os espíritos, já que uns não vão sem os outros aonde quer que seja. A questão do laicismo não passa, portanto, de uma primeira escaramuça. A autêntica confrontação chegará quando finalmente se opuserem crença e descrença, indo esta à luta com o seu verdadeiro nome: ateísmo. O mais são jogos de palavras"

José Saramago (Prêmio Nobel de Literatura, para quem não captou a ironia anterior).

2 comentários:

  1. Um estado Laico seria o caos.
    Povo precisa de controle.

    O que seria legal mesmo, era poder controlar a religião.

    Imagina o Papa gritando da sua bancada no Vaticano:
    - Bom gurizada, cagamos!
    - Foi mal! Mas vamos concertar as coisas!
    - Usem camisinha!
    - A ciência é nossa amiga!
    - Darwin é legal!
    - Separem o lixo!

    E que fique claro,
    eu sou a favor da Monarquia, contanto que eu seja o Rei.
    e da Democracia se eu for senador.
    e da igreja católica se eu for o Papa.

    Graaade Abraço!

    OBS: Ta, pode relaxar agora, eu levo tudo na brincadeira mesmo... =)

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  2. Vítors, tu é que precisas de controle. Mas fico tranquilo, pois daqui a 5 anos, terás um chefe apto a fazê-lo. Hehe, abração!

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